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Consequências da tripolaridade

 

1.- O Conselho de Ilha do Pico considerou, na sua última reunião, que “está na altura de acabar com a tripolaridade, nos Açores. Há tradições que já não se justificam e, nesse sentido, vai ser entregue uma proposta no Parlamento açoriano para debater esta matéria”.

O que se questiona é a actualidade da norma do Estatuto Político Administrativo (art.º76, nº 2), publicado em 12 de Janeiro de 2009,  que determina que “A Presidência e as Secretarias regionais têm a sua sede nas cidades de Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada.” Na verdade, não se determina em que cidade ficam instaladas a Presidência e as respetivas Secretarias, como também nada se refere sobre a localização das Direcções Regionais; no meu entender, o legislador não teve intenção de as circunscrever às ex-capitais de distrito.

Há, portanto, uma prática conservadora do artigo da lei 2/2009, ao não se alterar procedimentos de décadas que centralizaram o poder destas ilhas nas capitais dos ex-distritos, menosprezando as restantes seis.

Esta orientação política, que nenhum partido teve coragem de corrigir, é contrária ao estipulado no art.º13 do Estatuto onde se diz, claramente, que o princípio da continuidade territorial e ultraperiferia, obriga os órgãos de governo próprio da Região, a eliminarem as desigualdades estruturais causadas pelo afastamento de todas e cada uma das ilhas, em relação aos centros de poder.

Ora as dificuldades de acesso aos órgãos de poder geram não só desigualdades no tratamento e acesso aos serviços oficiais, como também impossibilitam os residentes das restantes seis ilhas de ingressarem nos empregos dos departamentos regionais instalados nas ex-capitais.

A prática governativa contradiz ainda a tão propagada “realidade Ilha” e ainda o estipulado no art.º 126, onde se defende que “a organização da administração regional autónoma obedece aos princípios da descentralização e da desconcentração de serviços, tendo em consideração os condicionalismos de cada ilha e visando assegurar uma actividade administrativa rápida, eficaz e de qualidade.”

Embora se afirme que o Governo dos Açores deve promover a existência de serviços dos seus departamentos (não creio que o legislador, sub-repticiamente, tenha pretendido impedir a instalação de direcções regionais, admitindo-se apenas direcções de serviços), o certo é que, até agora, Horta, Angra e Ponta Delgada e as respetivas ilhas, foram as beneficiadas com a maioria das repartições e serviços da função pública regional autónoma e central.

Esta praxis é responsável pelo acentuado decréscimo e envelhecimento da população, de onde resultam a diminuição da actividade económica nas vertentes comercial, industrial e de serviços, a menor qualidade dos serviços sociais, nomeadamente, dos cuidados de saúde primários e diferenciados, o acesso às diversas vertentes do ensino secundário e à dificuldade de resposta rápida dos organismos regionais, nomeadamente, das obras públicas.

Os exemplos são, por demais, evidentes e qualquer cidadão, nomeadamente da Ilha do Pico sente, na carne, as consequências deste crónico “abandono” e distanciamento.

2.- Há cerca de um mês, excecionais caudais de água das chuvas extravasaram leitos de ribeiras, destruíram lanços de estradas regionais e municipais do norte e do sul e inundaram habitações. As populações sentiram-se ameaçadas e indefesas face à força dos elementos que, de ano para ano, dão claros sinais de que algo está a mudar.

Passado um mês, a estrada regional continua intransitável entre Santa Bárbara e o Ramal de Santa Cruz, e o trânsito faz-se por caminho de dimensões reduzidas. Se a situação se repetir, pode ser mesmo interrompido. E que informação é dada às populações afectadas sobre o arranjo da estrada? Nenhuma! Qual a prioridade e celeridade na resolução do problema? Há intenção de adjudicar os trabalhos de reparação a empresa competente, ou está-se a pensar reparar os prejuízos com recurso ao pessoal das obras públicas que, por falta de meios, dura anos a “levar a carta a garcia”?

Se a situação tivesse ocorrido noutra ilha com ex-capital, já teria havido, por influência da opinião pública, visita oficial e seriam encontradas alternativas rápidas para minimizar um problema que, pela sua complexidade – admito - ameaça durar tempos a resolver, se, entretanto, novas cheias não ocorrerem antes do verão.

É por tudo isto que as populações jovens vão deixando de querer viver aqui. Sem acesso aos “bons” empregos do estado, sem consumidores que os impulsionem a rentabilizar novos negócios, com dificuldades de acesso aos serviços oficiais e sem resposta satisfatória em situações de doença, eles partem para as três ex-capitais e aí se fixam.

A promoção e o favorecimento constantes das três centralidades são os grandes responsáveis pelo envelhecimento de seis ilhas açorianas. Se isso não for contrariado, rápida e eficazmente, o seu destino será o abandono e o despovoamento.

Daí os picoenses estarem convencidos que o Conselho de Ilha do Pico colocou o dedo na ferida.

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